Sobre as transcrições

Priorizando a performance do canto, a nossa interpretação do repertório musical conexo à devoção penitente de Juazeiro do Norte agrega às simbólicas do fenômeno musical a sua capacidade de “produzir” uma experiência religiosa. Mais do que um sistema de comunicação, consideramos o canto como um instrumento de transformação que executa no corpo uma forma, uma fisionomia, que é tanto o resultado de uma experiência sagrada específica como a encarnação de um pensamento religioso, em cuja performance se desvelam as reentrâncias simbólicas e os valores interditados no âmbito verbal.
Em nosso estudo, a transcrição musical, apesar de se configurar como um importante recurso para a realização de inferências relativas a seções, frases, contornos melódicos e organização silábica do texto, pouco informa sobre alguns aspectos que são essenciais para o nosso enfoque analítico. As peculiaridades que anotamos em relação ao timbre, ao ritmo e à afinação são completamente refratárias a sistemas de notação musical, que ao bem da clareza e uniformidade das informações gráficas, recorre a uma escritura baseada em padrões de simetria, seja estabelecendo regras de proporção rítmica, seja parametrizando relações frequenciais. Assim, as transcrições apresentadas neste blog funcionam como um instrumento para direcionar a escuta de pesquisadores, artistas e mesmo curiosos sobre o tema, não carregando a presunção de registrar a riqueza de nuanças mobilizadas durante a performance do canto.

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